Por que as projeções para usinas são positivas mesmo com moagem menor e custos em alta

Por Delcy Mac Cruz

Entre as boas notícias está a incidência de chuvas intensas, que favorecem a cana a ser processada na próxima safra

Créditos de imagem: Sosicana/Divulgação

O saldo de informações da safra de cana-de-açúcar em andamento, a 2022-23, é bem desafiador para as usinas do Centro-Sul, principal região produtora de etanol e de açúcar do país.  

É o que revela levantamento da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), com dados acumulados entre 1º de abril, quando a safra teve início oficial, e 1º de outubro.

Para se ter ideia, dos 11 indicadores de produção apurados pela entidade, apenas um é positivo: o que revela alta do etanol em relação ao açúcar no mix (destinação da cana) das usinas.

Por sua vez, o processamento de cana, por exemplo, está 7,88% abaixo da safra anterior e a menor oferta de matéria-prima faz cair as produções de açúcar (-9,90%) e de etanol (-5,84%).

Tem também o ATR, sigla para Açúcar Total Recuperável, que é a soma dos açúcares contidos na cana e efetivamente aproveitados no processo industrial. De forma geral, quanto maior o ATR, melhor para a produção. Pois ele registra recuo de 9,06% ante o ciclo anterior.

Raio-x da safra no Centro-Sul

(entre 1º de abril e 1º de outubro)

Fonte: UNICA. Nota: ¹ - mil toneladas; ² - milhões de litros; ³ - kg de ATR/ tonelada de cana

Projeções otimistas para 2023

Mas calma lá: a maioria do saldo de informações já era esperada.

Em primeiro lugar, há menos cana sendo colhida. “A estimativa é de que 3,99 milhões de hectares sejam colhidos neste ciclo [no estado de São Paulo], queda de 5,26% na comparação com a safra passada”, relata a Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (FAESP).

Essa diminuição, segundo a entidade, reflete a redução da área em produção e a redução de chuvas.

As precipitações foram menores em consequência do fenômeno La Niña, que, a depender da intensidade, gera mais ou menos volumes. Ocorre que ele perdeu força nos primeiros meses do ano.

Já a menor disponibilidade de cana, segundo motivo apontado pela FAESP, pode ser explicada pela troca da matéria-prima por outra cultura ou, então, por menos investimento em tratos culturais, que também reduzem a oferta.

Ainda no tocante a chuvas, elas, que foram volumosas, em setembro, também impactam as operações de colheita.

É que esse trabalho envolve pesadas máquinas colhedoras, tratores e equipamentos de transporte que, com lama, reduzem os resultados operacionais.

Contudo, a chuvarada de setembro indica boa notícia para a próxima safra.

Isso porque a água é pra lá de necessária seja para a cana em crescimento, como para a chamada soqueira, que gera ciclos sucessivos da planta a partir da rebrota.

Em meio a isso, companhias como a Coruripe, que controla cinco unidades produtoras, têm projeções otimistas.

“Se as chuvas continuarem, vai ter 1 milhão de toneladas a mais” que a capacidade, disse ao Valor o CEO da empresa, Mario Lorencatto.

Hoje, as unidades da Coruripe (quatro em Minas Gerais e uma em Alagoas) podem moer 15,5 milhões de toneladas por safra.

O açúcar também tem estimativa positiva.

Em termos de produção, ela tende a  avançar na safra 2023/24 ante a atual. As usinas do Centro-Sul poderão produzir 36 milhões de toneladas, segundo projeção de Plínio Nastari, diretor da consultoria Datagro, divulgada pelo Valor.

Veja só: o volume projetado supera em 4 milhões as 32 milhões de toneladas que, conforme levantamento da UNICA, foram produzidas pelas unidades do Centro-Sul na safra 21/22.

O peso dos custos

Por conta das incertezas climáticas, ainda é cedo para avaliar quanto de cana estará disponível para a próxima safra no Centro-Sul.

No caso do ciclo em andamento, já se sabe que, fora o saldo produtivo, tem, ainda, a questão dos custos.

Em março, um mês antes do início da safra no Centro-Sul, o Instituto Pecege divulgou levantamento que destaca alta de custos de 40% ante a safra 21/22.

Quem são os responsáveis?

Conforme o estudo, divulgado pelo Valor, entre os fatores determinantes estão a alta nos custos de insumos como fertilizantes e diesel, o aumento no valor dos arrendamentos das terras e as quebras da safra anterior.

Mais: nesta conta o Pecege considera tanto os custos apenas operacionais quanto as perdas com depreciação e o custo de capital. O estudo inclui quase 50 empresas responsáveis pelo processamento de 40% da cana do país.

Apesar de tudo isso, o setor sucroenergético segue com exemplos vigorosos na safra 22/23.

Um deles é a produção de açúcar.

Caso a estimativa do diretor da Datagro seja confirmada, e as usinas do Centro-Sul cheguem a 36 milhões de toneladas, o setor terá condições de exportar 30 milhões de toneladas, atender ao mercado interno e, de quebra, ajudar a gerar superávit mundial de 4 milhões de toneladas - volume necessário para garantir a segurança global do alimento.

Outro exemplo da safra vigente que merece ser reforçado é a exportação de etanol pelas unidades do Centro-Sul.

Em setembro, relata a UNICA, o volume de etanol hidratado (veículos flex) comercializado no mercado externo foi de 140,92 milhões de litros (alta de 2,93% sobre setembro de 2021) e, no caso do anidro (misturado à gasolina), as vendas somaram 209,54 milhões de litros (mais 264%).

Ao todo, o setor exportou 1,24 bilhão de litros entre abril e começo de outubro, avanço de 33,05% ante igual período da safra anterior.

Em linha com esse resultado, mais a valorização do dólar, o setor sucroenergético embarcou US$ 1,48 bilhão em setembro, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

Para efeitos de comparação, o montante supera em 52,4% as exportações de igual período de 2021.

E em que pese o bom desempenho das vendas externas de etanol, o açúcar segue na liderança, responsável por US$ 1,24 bilhão, ou 84% do total embarcado a partir das usinas.