Como as usinas ampliam a produção mesmo com menos cana cultivada

Por Delcy Mac Cruz

Em oito anos, total de hectares caiu em 2 milhões, mas a fabricação de açúcar e de etanol só cresceu.

Crédito da imagem: Adecoagro

A área plantada com cana-de-açúcar cai ano a ano, mas a produção de açúcar e de etanol, entre outros produtos canavieiros, só aumenta. 

Como assim? 

Existem várias respostas e, entre elas, estão investimentos em soluções de melhoria industrial. 

Mas tão importante quanto esses é o ganho de produtividade no campo, já que a área agrícola responde por 60% da produção de um litro de etanol ou de um quilo de açúcar. 

Vamos aos exemplos?

Vale destacar que os dados são da Conab (Ministério da Agricultura), do Instituto de Economia Agrícola (governo paulista) e da entidade do setor Unica. No tocante à área nos 19 estados que cultivam cana, ela totalizava 10,2 milhões de hectares em 2013 e ficou na casa de 10 milhões até 2021. A partir desse ano, a área caiu para 9,8 milhões de hectares e, em 2022, despencou para 8,1 milhões de hectares. Já para a safra vigente, a 23/24, a área subiu 300 mil hectares ante o ano passado, chegando, segundo a Conab, a 8,4 milhões de toneladas. 

Área com cana no País

(segundo o IBGE)

Qual é a explicação para a queda de área?

A atratividade dos preços dos grãos explica - e muito bem - a substituição de cana por soja e milho. 

Para se ter ideia, a Conab destaca que a área destinada à atividade sucroenergética sofreu redução de 2,6% entre 2021 e o ano passado, quando ficou nos 8,1 milhões de hectares citados acima. 

Fora a concorrência com os grãos, o setor sucroenergético também registrou menor quantidade de áreas de reforma (realizada quando o canavial velho dá lugar a um novo). Aqui, os vilões foram as geadas e a estiagem registradas em 21 e que impediram os investimentos em reforma. 

Entretanto, os canaviais devem avançar em 300 mil hectares na safra em andamento - a 23/24 - e o motivo, conforme a Conab, “é justificado pelo aumento de áreas de expansão e renovação.”

Além disso, prossegue, as condições climáticas para a safra estavam ainda melhores que na safra anterior.

Vale lembrar que essa projeção foi feita pela Conab em abril, mês oficial de início do ciclo na região Centro-Sul. Outras projeções serão apresentadas ao longo da safra. 

Moagem só avança

Em que pese a queda de área, a moagem (corte da cana e seu processamento industrial) só avançou entre 2009 e 2021. 

Conforme os dados consolidados da Conab, das 603 milhões de toneladas moídas na safra 2009/10, o número saltou para 657,5 milhões de toneladas processadas no ciclo 20/21.

Agora repare a produção na safra 13/14 (com área de 10,2 milhões de hectares): ela chegou a 38 milhões de toneladas de açúcar e a 27 bilhões de litros de biocombustível. 

Já no ciclo 20/21 (com 9,9 milhões de hectares), as usinas produziram 41,5 milhões de toneladas do adoçante e 35,5 bilhões de litros de etanol. 

Daí se vê que mesmo com 200 mil hectares a menos, o setor moeu 6 milhões de toneladas extras e fabricou mais 3,5 milhões de toneladas de açúcar e 8,5 bilhões de litros de etanol. 

Vai e vem da moagem e da produção: 

Motivos do avanço produtivo

Uma projeção é unânime entre instituições e entidades: a safra 23/24 tende a ser mais produtiva que as anteriores. Para a Conab, por exemplo, a estimativa é de novo aumento de produção da ordem de 4,4%, impulsionado principalmente pelo avanço da produtividade em 2,9%. 

Mas há armadilhas pelo caminho que podem minar o otimismo. Entre elas está a possibilidade de registro do fenômeno climático El Niño de alto impacto. 

O último deles considerado forte foi em 2016, responsável por chuvas fora de época em regiões canavieiras do Centro-Sul, bem como seca extrema nas regiões Norte e Norte, que respondem por 50 milhões de toneladas por safra. 

As últimas previsões estimam em 60% as chances de o El Niño vir forte entre junho e agosto. 

Diante disso, gestores de muitas usinas apressam o processamento de cana o quanto podem. Motivos: se vier chuva fora de época não dá para operar colhedoras em meio a lama e, se tiver seca extrema, ela retira açúcar da planta, o que reduz - e muito - a qualidade. 

Açúcares como indicadores

Aliás, a qualidade da planta é medida pelo indicador Açúcar Total Recuperável (ATR). Ele explica a quantidade de açúcares da cana que serão recuperados para serem processados na indústria. Quanto mais, melhor. 

Na primeira avaliação da Conab, feita em abril, a média informada para o ATR era menor se comparada ao fechamento da safra anterior. 

Essa queda, no entanto, não assusta porque, conforme a Conab, a retração do ATR será compensada pelo TCH.

TCH?

É outro indicador para a produtividade canavieira, chamado de Toneladas de Cana por Hectare (TCH). De novo: quanto mais, melhor. 

Em resumo, segundo a estimativa oficial em abril esse indicador registrava alta de 2,9% ante a safra anterior. Ou seja, cada hectare rendia 75,7 quilos, contra 73,6 quilos do ciclo 22/23. 

Cumprindo sua parte 

Embora eventos como o El Niño possam jogar pedra no caminho, a safra canavieira tende a crescer em produção mesmo com menor área ante ciclos recentes. 

Por sua vez, o mix também deve ser mais açucareiro, com maior percentual da cana empregada para fazer o adoçante no lugar de etanol (leia mais a respeito de projeções de produção aqui). 

No mais, o setor sucroenergético cumpre sua parte no universo sustentável com menor avanço de área e oferta maior de produtos de comprovados benefícios ambientais.