Por que a safra 23/24 oferece pelo menos 6 projeções otimistas
Por Delcy Mac Cruz
Usinas também terão desafios ao longo do ciclo prestes a iniciar
Crédito da imagem: Raízen/Divulgação
A safra de cana-de-açúcar 2023/24 da região Centro-Sul do país tende a ser marcada pelo otimismo. Vale destacar que nem tudo é motivo de celebração e o setor sucroenergético terá desafios pela frente.
Entre os desafios estão gargalo de logística para exportação portuária, a possibilidade do fenômeno El Niño no segundo semestre, que provoca chuvas no Centro-Sul, fora o plantio atrasado de cana para 2024.
Mas há indicadores positivos de sobra para o ciclo, que oficialmente tem início em 1º de abril e geralmente segue até dezembro próximo.
Aliás, no começo de fevereiro apresentamos aqui 6 projeções otimistas para a safra no Centro-Sul, entre elas maior produtividade da matéria-prima e produções maiores de etanol de milho e de açúcar (leia aqui sobre essas projeções).
Desta vez, seguem 6 indicações positivas para o ciclo na região do país que concentra 90% da produção brasileira de açúcar e etanol de cana.
1 - Maior oferta de cana
As unidades do Centro-Sul do país terão 590 milhões de toneladas de cana para processar na 23/24, conforme projeção da consultoria Datagro no evento Abertura de Safra em 08 de março, em Ribeirão Preto (SP). Trata-se de oferta 6,9% acima na comparação com o ciclo anterior. No mesmo evento, a Raízen projetou moagem de 600 milhões de toneladas.
Segundo a Datagro, o motivo da alta é o ganho de produtividade por conta de investimentos e das precipitações pluviométricas durante a fase de crescimento da planta. Em linha com isso, um indicador é o volume de Açúcares Totais Renováveis (ATR) por tonelada de cana, cuja oferta total deverá crescer 7,7% na nova temporada.
2 - Mais açúcar
O ciclo 23/24 será açucareiro. Do total de cana a ser processado, 48% irão para fazer o adoçante, alta de 2,4% sobre o ciclo anterior, conforme projeção da Datagro. Com o mix mais açucareiro, a consultoria estima ser possível chegar a uma produção de 38,3 milhões de toneladas, 13,1% acima do montante ofertado na safra anterior.
3 - Preços do açúcar em alta
Mas qual o motivo de produzir mais açúcar? Simples: os estoques mundiais estão em baixa e, assim, os preços tendem a ser remuneradores. Veja o caso da Índia, segundo maior produtor de açúcar: ela deve converter cana em etanol para atender o mercado doméstico do biocombustível. Com isso, a oferta do adoçante será menor em um estoque mundial cujo déficit é estimado em 2,1 milhões de toneladas no ciclo global de açúcar 23/24 (outubro a setembro), conforme previsão da Louis Dreyfus Commodities (LDC). “Fundamentos de mercado internacional devem manter preços de açúcar suportados em 2023 e, provavelmente, acima do etanol durante toda a safra”, disse, no evento de março, Plínio Nastari, presidente da Datagro.
4 - Etanol também avança
Em que pese o mix açucareiro, a oferta de etanol também será crescente. Mas, aqui, a maior oferta se deve ao etanol de milho, cuja produção, conforme a Datagro, deverá crescer 17,4%, saltando de 4,60 bilhões de litros em 2022 para 5,40 bilhões de litros neste ano. No caso do etanol de cana, a produção, conforme a consultoria, deverá ter alta de 5,9% ante o ciclo anterior, indo a 30,96 bilhões de litros, sendo 11,7 bilhões de litros de anidro (para mistura à gasolina) e 19,26 bilhões de litros de hidratado (para veículos flex).
5 - Exportações de etanol
As vendas externas do biocombustível foram positivas em 2022 e entraram no mesmo ritmo neste ano. Entre janeiro e fevereiro, a Datagro estima que o Brasil tenha embarcado 417 milhões de litros, alta de 136,5% ante o registrado há um ano. Já no acumulado entre abril/22 e fevereiro, a Unica, entidade representativa do setor, destaca que as exportações de etanol somaram 2,360 bilhões de litros, sendo 1,423 bilhão de litros de anidro e 937 milhões de litros de hidratado. O montante exportado supera em 60% o total embarcado no mesmo período anterior (1,424 bilhão de litros).
Nastari: “momento de planejar novos passos”
6 - Novas rotas
Apesar dos indicadores positivos, o presidente da Datagro relata que será “ano para pagar contas” e planejar investimentos em novas rotas de diversificação. “Os biocombustíveis podem ser o motor da reindustrialização do país”, disse no evento em Ribeirão Preto, destacando o emprego dos renováveis como matéria-prima de veículos híbridos (para mover motores eletrificados). Lembrou, também, tecnologias disruptivas do setor, como pellets de bagaço de cana e o bioquerosene de aviação (BioQav). “É preciso atrair capital”, disse. Mas, enfim, reforçou: “o momento é de planejar novos passos [para o setor].”
RETRANCA
As avaliações de Figliolino
Alexandre Figliolino, sócio-diretor na MBAgro Consultoria, tem expertise de sobra como analista do setor sucroenergético, e conversou com esta plataforma de notícias da Fenasucro sobre a safra 23/24 no Centro-Sul.
Confira suas avaliações:
Produtividade: “Teremos um ganho, para tirar o atraso da safra 2021/22, que foi um desastre. Sendo assim, poderemos chegar a uma moagem de 600 milhões de toneladas de cana, depois de processar 540 milhões de toneladas.”
Custos de insumos: “Os custos de insumos, como fertilizantes, têm caído, embora parte deles já estão incluídos porque foram feitos durante o processo agrícola. Mas, de qualquer forma, o setor irá aproveitar isso [queda de preços] nos tratos e no plantio de cana.”
Diesel: “Os custos do diesel [em queda no começo de março] são muito importantes. Ou seja: com o aumento de produtividade e redução de valores, teremos custos monetários mais contidos.”
Açúcar: “Os preços têm mostrado sustentação muito boa, e a Índia pode ter mesmo quebra de safra, por redução de área plantada, mais a conversão de cana que fará para etanol. Essa quebra pode resultar em 3 milhões de toneladas de açúcar.”
Safra açucareira: “Por isso, teremos uma safra açucareira no último. Todo mundo vai tentar produzir o máximo de açúcar possível.”
Etanol: “O que estava pesando um pouco, que é a questão do etanol, veio a reoneração parcial, o que não é o que se queria, mas é melhor do que estava. Vale aí a sinalização do governo federal pelo combustível renovável.”
Cenário: “Sendo assim, diante um cenário de economia muito complicado, o setor sucroenergético irá passar um pouco por fora dessa situação, em que o crescimento econômico, se tiver, será pífio.”
Crédito: “O sinal disso é que a oferta de crédito para as usinas não diminuiu. Pelo contrário: há oferta de linhas de crédito para as boas usinas.”
Desafio logístico: “É enorme. Quando se ouve falar que em março o Brasil irá embarcar 14 milhões de toneladas de soja, esses embarques só deverão cair lá por julho, mas é quando começa a safrinha de milho, cuja exportação neste ano deverá ser recorde. Ou seja, se formos exportar 50 milhões de toneladas de milho e mais 90 milhões de toneladas de soja, o açúcar terá de cavar espaço no meio dessas duas safras gigantes.”
Etanol de milho: “Ele tem papel importantíssimo, tende a ser crescente. Estava em 4 bilhões de litros por ano e agora vai para mais de 5 bilhões de litros. É claro que para uma indústria que só faz etanol de milho, e quando o preço dele fica caro, cria problema. Até porque ela não tem a fonte de energia da cana, usada para produzir eletricidade e mover a usina. Mas eu aposto muito nas usinas flex, que produzem etanol com cana e também possuem destilarias anexas a milho.
No mais, o etanol de milho mudou a história da entressafra brasileira. Quando só havia etanol de cana, havia uma entressafra (período de parada da indústria) mais nervosa, com questionamentos se iria ou não faltar biocombustível. Como o etanol de milho é produzido sem interrupção, acabou com o problema.”